Autossabotagem: quem nunca?

A autossabotagem é a tendência a colocar limites e complicações a si mesmo durante o caminho em direção a metas ou objetivos. A pessoa que boicota a si mesma cria travas e, inconscientemente, diz “não vou poder” quando precisa enfrentar momentos difíceis.
Talvez essa atitude nos proteja em alguma medida do fracasso a curto prazo, mas também nos priva do êxito.
Em 1916, Freud escreveu o artigo “Os que fracassam no triunfo” falando das pessoas que sentem um medo irracional da satisfação e ficam aliviadas quando as coisas não dão certo. O conhecido “medo de ser feliz”.
Freud diz que isso satisfaz um desejo de punição e tem a ver como lidamos com a culpa. E a relação entre culpa e desejo.
Tentar agradar as expectativas do outro é um dos principais motivos que nos levam a nos autossabotar e desistir de nossos sonhos. Na busca por aceitação e pertencimento, tendemos a tirar o foco de nossas prioridades e sonhos e nos mantermos no lugar de subordinação onde nos sentimos mais protegidos e, inclusive, onde acostumamos a viver. Essa transição de posição sobre o sujeito do desejo é uma das circunstâncias em que ocorrem a autossabotagem.
Outra condição de autossabotagem nos leva a ideia de que é muito difícil e angustiante realizar um desejo. Um desejo, segundo Lacan, tem a ver com a falta. Tem a ver com o que a gente não tem. Tem a ver com o que completaria um certo sentido. Portanto, a falta tem a função organizativa para a gente, para nossa vida: enquanto eu não cheguei lá ainda, eu ainda sei para onde ir. Mas e… e quando eu chegar lá? E depois? Para onde vou? Com esse medo de perder a direção, quando nos aproximamos deste lugar de realização daquilo que seria o objeto de desejo, o repelimos. Nos sabotamos.
Também temos a autossabotagem aliada à ideia de que há uma permanência do sentimento de culpa. Pessoas que desenvolvem uma curiosa relação com a culpa onde não há possibilidade de viver sem isso. Pessoas que precisam estar em estado de dívida com os outros e/ou em relação a elas mesmas. Dessa forma, acabam inviabilizando as realizações em sua vida. E, acreditem, há um certo prazer nisso (o gozo, segundo Lacan).
A verdade é que temos um “sabotadorzinho” dentro de nós e precisamos aprender a conviver com isso. Esse boicotador sempre irá nos dizer que não somos capazes de alcançar o que nos propomos e nos manterá dentro da nossa zona de conforto.
Psicanalistas afirmam que o processo da autossabotagem está ligado a pessoas que sofrem em alguma medida com baixa autoestima e que entram em um looping de “tenho baixa autoestima e me saboto ou me saboto e então fico com baixa autoestima.” (modo Tostines de viver, lembram?)
Ter convicção — confiança — a respeito das coisas que queremos conquistar e realizar é um começo para sair do processo de autossabotagem. Questionarmos com frequência: “estou fazendo isso pelo meu desejo ou o meu desejo está alienado no desejo do outro?”.
É preciso se desapegar das crenças limitantes que foram desenvolvidas ao longo da vida.
Consciência e mudança estão intrinsecamente ligadas e mexer em lembranças desagradáveis é dolorido. Ter consciência de nossa própria historia leva tempo. Consiste em fazer novas associações e então implementar mudanças significativas em nossa vida.
Quando a gente quer mudar, as informações necessárias chegam para realizar a mudança.
É aquela conhecida história de que não conseguimos resultados diferentes fazendo as mesmas coisas. Muda a ação. Muda o resultado.
Em opinião pessoal, penso que precisamos nos dar oportunidades, tentar coisas novas, nos arriscar a fazer diferente. E com paciência e vontade vamos nos aprimorando e vencendo a autossabotagem.
E é bem no gerúndio mesmo, porque é a jornada que vale a pena.
PS1: Esse texto é baseado em artigos, livros e textos de psicanalistas.
PS2: fiquei um mês tentando finalizar esse texto sem conseguir. Voltava diversas vezes, lia e fechava o rascunho. Decidi parar de me autossabotar e publicá-lo. (risos)